Análise poética da música “Construção” de Chico Buarque

Pensei em fazer uma análise da obra de Chico Buarque, Construção, mas só consegui em forma de outra poesia. Longe da perfeita concatenação de ideias do poeta que a compôs com rimas tônicas terminadas em proparoxítona, mas em versos livres de uma iniciante.

Análise de Construção

Os últimos momentos do sujeito invisível

Tomado por sua tristeza e solidão

Sufocado pelo mundo consumível

Que decide dar-se um fim, mesmo que em vão.

.

O operário a serviço da disciplina

Definido como se fosse máquina

Tramando com a bebida encontrar coragem

Para desistir de tudo de forma ávida.

.

Na repetição de sua rotina corporal

A nada mais se apega que o impeça

De desafiar seu ser mortal

Mesmo que dos queridos não se despeça.

.

Libertou-se ao tirar os pés do chão

Depois da certeza de que nada valeria

Ainda que alguns momentos de alegria

Contornar sua própria depressão.

.

Como ouviram sua história, não sabe

Pois neste mundo de individualidade

Nenhum ato covarde

Merece nossa atenção.

 

______________________________

Construção (Chico Buarque)

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague

Música Construção no Youtube