Referência fundamental latino-americana em educação, sustentabilidade e inclusão social, o filósofo colombiano Bernardo Toro palestrou, nesta quarta-feira (18), no almoço do Tá na Mesa, na Federasul. Diante de uma plateia lotada, formada por representantes do empresariado gaúcho, de instituições do Terceiro Setor e jornalistas, o reconhecido pensador falou por cerca de duas horas sobre as tendências e o futuro da América Latina, sobre o cuidado como paradigma da inversão de impacto e sobre o método de aprendizagem vigente. Toro veio a Porto Alegre para conhecer, durante um período de três dias (17 a 19 de novembro), o modelo de gestão e voluntariado da ONG Parceiros Voluntários que, segundo ele “é a organização mais importante do Brasil, por ser especializada em estratégias de cidadania”.
A Parceiros Voluntários iniciou suas atividades no ano de 1996, inspirada no projeto de Toro chamado “Mobilização Social para a Construção do Público”. “Toda nossa trajetória iniciou pela crença de que é possível mudar a cultura da nossa sociedade. Precisamos deixar esse sistema paternalista e acreditar na participação. Dessa forma vamos mudar a política, economia e a vida das pessoas”, frisou Maria Elena Pereira Johannpeter, presidente (voluntária) executiva da Parceiros Voluntários. Durante a apresentação, Toro expôs algumas das principais teses defendidas ao longo de sua trajetória, enfatizando que a sociedade precisa aprender a cuidar das relações com as pessoas próximas e também com aquelas que estão distantes. “A convivência de bairro, a colaboração empresarial, a qualidade da política, a produtividade e o bem estar cotidiano estão relacionados à capacidade que a sociedade tem de criar organizações ou pertencer a elas”, pontua. Para ele, “o maior indicador de pobreza é não estar organizado e o primeiro passo para sair da pobreza é a organização. Essa é a base da governabilidade e da sustentabilidade”.
O filósofo também observou que o desenvolvimento da América Latina depende de um empenho em criar e fortalecer as instituições sociais. “A segurança econômica, social e política de uma sociedade não provem nem da força nem do dinheiro, mas sim da qualidade das suas instituições. As instituições entendidas como arranjos arbitrários, que estabelecem regras para incentivar transações, são a base do bem estar e riqueza de uma sociedade”.
Bernardo Toro notabiliza-se no cenário mundial por ter sido o pioneiro na formulação de princípios fundamentais para o desenvolvimento de um ensino de qualidade, capaz de formar crianças e jovens preparados para ter participação produtiva no século 21 (Sete Códigos da Modernidade) e também por se dedicar, a partir de uma perspectiva científica e pragmática, às questões de mobilização popular no continente. Autor dos livros A construção do público: cidadania, democracia e participação, Mobilização Social: Um Modo de Construir a Democracia e a Participação e Fala Mestre: Precisamos de Cidadãos do Mundo, é decano acadêmico da Faculdade de Educação da Pontificia Universidad Javeriana de Bogotá e membro dos conselhos da Confederação Colombiana de ONGs e do Centro Colombiano de Responsabilidade Empresarial. Já atuou como consultor do Bando Mundial e atualmente é assessor do comitê estratégico da fundação suíça Avina. No Brasil, já desenvolveu trabalhos junto ao governo de Minas Gerais, na reestruturação do modelo de educação do Estado.
Principais pensamentos de Bernardo Toro no Tá na Mesa, em Porto Alegre:
Consolidação democrática:
“É necessário reforçar as instituições, o poder cidadão, os governos locais, a sociedade civil, a transparência, os direitos da mulher e dos povos indígenas, a convivência e segurança, e fortalecer os acordos internacionais para a governabilidade democrática em todo o mundo”.
Da inteligência guerreira:
“A inteligência guerreira é aquela vista como propriedade pessoal, privada e interna. Utilizada para dominar, ganhar e que se manifesta no desempenho de provas que são critérios de seleção. Então, existem as escolas que pretendem que seus estudantes sejam os mais inteligentes, os mais competentes em diferentes provas de avaliação de habilidades intelectuais, e tenham melhor saúde mental. Essa modelo de educação existente na América Latina seleciona os melhores e usa a inteligência como um fator de exclusão”.
Da inteligência altruísta ou o altruísmo cognitivo:
“Precisamos desenvolver a capacidade de buscar ajuda nas tentativas de solução de um problema, reconhecendo as fraquezas e aplicando o cuidado”.
“Desenvolver a responsabilidade política, social e cultural do uso do intelecto: como devo ajudar? A principal implicação dessa visão é que o cuidado do intelecto não custa e é um presente por seu caráter social, público e inclusivo”.
“Saber oferecer ajuda e saber pedir ajuda é uma das competências fundamentais para os novos líderes de uma sociedade global”.
Inclusão social:
“Precisamos trabalhar para reduzir a pobreza e a desigualdade, eliminar discriminações, promover igualdade de oportunidades e redes de proteção social, fornecer bens e serviços públicos de qualidade, com inclusão de moradias, saúde, educação, espaços urbanos coletivos, transporte público e redes de comunicação digital”.
Mudanças climáticas:
“Assim como no universo nada resiste a gravidade, na terra nada resiste às mudanças climáticas”.
“Tem que haver eficiência no uso da água, da energia e das tecnologias ecológicas para garantir a segurança alimentar, prevenir desastres naturais e reduzir a contaminação, o desmatamento e a perda de biodiversidade”.
O cuidado como paradigma da inversão de impacto:
“O dinheiro se converte em um projeto ético quando é usado para criar passivos saudáveis, que vão se converter em ativos que contribuem para a dignidade humana”.
“O critério ético, orientador para a inversão de impacto, é estimar ou ponderar em que medida essa inversão contribui para tornar possíveis os direitos humanos e para proteger ou fortalecer os serviços ambientais”.
“Riqueza é o conjunto de bens, serviços, valores, ambientes, relações e transações que nos permitem viver com dignidade, cuidar dos serviços ambientais e sermos felizes”.
“O planeta não está em perigo. É a espécie humana que está correndo o risco de perecer”.
“Investir em investigação e desenvolvimento de modelos e tecnologias para a formação e fortalecimento do autoconhecimento, da auto-regulamentação e da autoestima, são oceanos azuis que estão esperando”.
“A consolidação de vínculos saudáveis e sólidos são o fundamento da boa convivência, da produtividade, da cultura de colaboração, da compaixão e uma forma comprovada de prevenir os vícios, a depressão e o suicídio”.
Nova visão:
“Não devemos, nem é possível construirmos uma muralha para nos isolar e proteger nossos recursos diante das consequências que outros vão sofrer pelo aquecimento global e pelas mudanças climáticas. Seremos e podemos ser parte fundamental do bem-estar da espécie humana se aprendermos e implementarmos os valores desta nova cosmovisão do cuidado. Esse é o novo significado que, como latino-americanos, podemos oferecer a todos para a nova humanização. É o aprendizado herdado de nossos ancestrais que nos ensinam a viver bem.”